ANTONIO TUCCILIO
O Brasil vive uma nova rodada de reformas que, se mal calibradas, podem produzir um desmonte silencioso do serviço público, não por um ato único, mas pela soma de medidas que fragilizam estabilidade, concursos, carreiras e planejamento de longo prazo. A CNSP entende que modernizar é necessário, mas o risco está em confundir eficiência com desestruturação do Estado.
Na Reforma Administrativa (PEC 32), o debate voltou à pauta em 2025. O relator na Câmara sinalizou recuos em pontos sensíveis, mas não há consenso público sobre salvaguardas a estabilidade, mérito e carreiras típicas de Estado. A incerteza e a possibilidade de mudanças por fora do diálogo com sociedade e entidades, mantém o alerta aceso entre servidores e especialistas.
No campo orçamentário-judicial, a Emenda Constitucional 136/2025 (originária da PEC 66/2023) alterou o regime de precatórios com a promessa de dar previsibilidade aos entes federados. O problema é que, ao flexibilizar prazos, a norma pode alongar pagamentos e corroer a confiança de cidadãos que venceram o Estado na Justiça, especialmente aposentados e pensionistas. Aqui, governança fiscal não pode significar postergação indefinida de direitos.
Outro vetor de desmonte é o avanço do vínculo celetista e da terceirização estrutural por meio de contratos de gestão. A expansão do terceiro setor na prestação de serviços públicos amplia a demanda por regulação e controles; sem isso, fragmenta equipes, eleva rotatividade e submete funções permanentes à lógica de governo (e não de Estado). reforçando a necessidade de regras de responsabilização, transparência e proteção do interesse público.
A combinação desses movimentos atinge precisamente áreas que precisam de estabilidade para planejar políticas de longo prazo, educação, saúde, segurança, ciência e gestão fiscal. Só a educação básica mobiliza 47,1 milhões de matrículas e demanda previsibilidade de pessoal e orçamento; improvisos institucionais cobram caro no futuro.
A CNSP defende um caminho de modernização responsável:
Estabilidade e concursos como pilares de imparcialidade e continuidade;
Carreiras estruturadas com avaliação séria, formação contínua e perspectiva de desenvolvimento;
Regras claras de remuneração (RGA na LDO, teto único, modelos que coíbam distorções sem punir o mérito);
Transparência e participação social efetiva em qualquer reforma que altere o pacto do serviço público;
Segurança jurídica nos precatórios e RPVs, com prazos factíveis e respeito a quem tem crédito contra o Estado;
Tecnologia a favor do servidor e do cidadão, automação para reduzir filas e erros, nunca para precarizar vínculos.
Modernizar, sim. Desmontar, não. O Brasil precisa de um Estado profissional, previsível e capaz de atravessar governos com políticas públicas que entreguem resultados. A CNSP seguirá mobilizada, apresentando evidências, dialogando com o Parlamento e defendendo carreiras, direitos e os interesses da sociedade.
Antonio Tuccilio
Presidente da Confederação Nacional dos Servidores Públicos