AUREMÁCIO CARVALHO
Estamos entrando em plena campanha eleitoral de 2014: candidaturas, coligações, campanhas, discursos, marketing...
O que esperar? O de sempre: dossiês; difamações; injúrias, escândalos pessoais e familiares a explorar, mentiras, falsidades?....
Esse filme nós conhecemos muito bem e não gostaríamos de rever. É possível mudar? A cultura ocidental escolheu a razão como forma de vida social e política.
A instauração do discurso da razão, pelos gregos no século V a.C, teve como resultados imediatos a renúncia à violência e à força bruta como armas prediletas, dando lugar à fala- “logos”, ao argumento em lugar do fato bruto como argumento.
A passagem do mito ao logos assinala o nascimento da cultura ocidental, ao primado da razão, da qual, somos herdeiros.
A decisão de dar razão- argumento, explicação dos nossos atos, criou na Grécia, o “Ágora”- o primeiro parlamento e a primeira assembleia de homens livres.
A palavra passou a ser o principal argumento, capaz de convencer e reconciliar os homens, dar legitimidade aos seus atos; assim, o Rei foi obrigado a explicar suas ações (1215- João Sem Terra); o proprietário a justificar sua posse; a igreja a justificar sua fé (Reforma e Contra-Reforma); o cientista a explicar, racionalmente, o universo ( Kepler, Newton).
Assim, pela palavra, o fato, o ato é legitimado em verdade e desse modo, elevado à universalidade, ao consenso social e cultural.
O poder político não pode ser exercido sem a legitimidade da razão e do consenso dos cidadãos. Ou seja, o discurso político tem que guardar coerência com a realidade.
O discurso político, muitas vezes, não é isento de erros- até propositais, de equívocos e de falsas razões, levando o eleitor/a- menos avisado e crítico- à aceitação da falsidade, do erro como justificativa de fracassos políticos.
O significado da palavra não tem relação com a realidade, mas busca, simplesmente, escondê-la. Na luta pelo poder, tudo é permitido: o adversário político aparece como “inimigo” e precisa ser aniquilado, destruído, principalmente em sua honra, através de um discurso “marqueteiro”, que penetra até os rincões da Pátria, levando uma falsa mensagem, que, recebida, sem crítica, se torna verdade absoluta.
A dissolução do estado ético priva a sociedade de padrões de decência e dignidade. O cidadão/eleitor, diante dos exemplos de desrespeito à lei, da dissipação dos recursos públicos, dos inúmeros escândalos, impunidades; de um Legislativo legislando em causa própria ou se submetendo ao Executivo, via benesses, cargos; de um Judiciário moroso e ineficiente, como reagir, como manter-se ético e coerente?
A decomposição do mundo ético traz consigo a decomposição política e moral da sociedade, como um todo. Tudo é permitido, tudo é aceitável, até pelo cansaço.
Educação é formação de caráter temperado pelas virtudes cívicas. É sempre política, pois se educa para a vida em comunidade- “polis”.
Um pai perguntou ao filósofo pitagórico Xenofilo o que devia fazer para educar seu filho. Ele respondeu: “faça-o cidadão de um Estado bem governado”.
A cisão entre a sociedade e a política- como a arte do bem comum- é uma das tragédias de nosso tempo.
Quando o nosso universo político chega ao estado de degradação moral que hoje experimentamos, surge a necessidade de mudança no discurso. A autocrítica dos políticos é, sem dúvida, o primeiro passo para uma mudança.
A regra do verdadeiro e do falso - como apresentado nos discursos políticos atuais, não pode continuar sendo orientado por ideologias ultrapassadas, “do salvador da pátria”, “de volta ao passado” instigando o medo; do “ nós fizemos mais do que eles ”-, mas, as mazelas continuam.
Como disse Demétrio, 307 a.C, “ tudo que a espada consegue na guerra, a palavra obtém na política”.
Que voltemos a esse tempo...
AUREMÁCIO CARVALHO é advogado em Cuiabá, ex-ouvidor da Polícia Civil de Mato Grosso.