ONOFRE RIBEIRO
Sem querer parecer saudosista, porque em tempos de “nunca antes na história deste país”, resgatar a história tornou-se politicamente incorreto. É como se tudo o que aconteceu antes não fizesse sentido. Só o presente conta. Nesta quina-feira à noite fiz uma palestra para estudantes de administração das diversas universidades locais em Tangará da Serra, 200 km a noroeste de Cuiabá.
Lembrei-me da Tangará que conheci em 1976, assim que cheguei a Mato Grosso. Era uma vila poeirenta, com casas de madeira nas suas poucas ruas. Virou município naquele ano. O que vi desta vez foi uma cidade com quatro universidades, uma sociedade estabilizada e uma economia muito diversificada. Ganhou cara de cidade consolidada e de município-polo regional. Como Tangará, vi Sinop, Alta Floresta, Juína, Canarana, Água Boa, Primavera do Leste, Campo Verde, em diversas regiões do Estado, em idêntica situação de nascimento e de crescimento.
Eram 38 os municípios mato-grossenses naquela ocasião. Hoje são 141. No conjunto, muitos mudaram de vocação econômica, como aqueles que eram extrativistas de ouro e de diamantes, como Poxoreo, Guiratinga, Alto Paraguai, Peixoto de Azevedo, Matupá e Pontes e Lacerda, entre outros. A economia se diversificou e já se tem um perfil delineado dos polos econômicos do estado no futuro.
Mas o que mais me atrai é a miscigenação racial. A partir de 1973 com o início intenso das migrações para ocupação da Amazônia, aqueles 598 mil habitantes da região Norte, hoje Mato Grosso, receberam milhares de migrantes vindos de todas as regiões brasileiras. No censo de 1980, a população dobrou para 1 milhão 139 mil habitantes e para 2.498 mil em 2000. Hoje somos 3 milhões e 33 mil. O crescimento populacional entre 1970 e 2010 foi de 507%.
Gosto de ver superadas as diferenças sociológicas de antes, as resistências mútuas entre os mato-grossenses originais e os chegados. Passados 40 anos, quase não se separa mais quem nasceu onde e que importância isso tem na realidade atual. O resultado foi uma mistura racial muito intensa que resultou na profecia do delegado regional do IBGE, Nelson Pinheiro, às vésperas do primeiro censo do novo estado, em 1980: “teremos um bugre de olhos azuis”. E temos mesmo passados 40 anos!
Por isso me sensibilizam as visitas a cidades daqueles tempos poeirentos e pioneiros, hoje transformadas em belas cidades definitivas. E junto, uma nova gente com identidade mato-grossense, independente de ter olhos azuis ou escuros.