MARCO AURÉLIO
Desde os tempos do Império, quando comerciantes improvisavam moratórias informais para driblar morosidades, até a Lei nº 11.101/2005, o direito brasileiro sempre buscou formas de amparar o insucesso empresarial. A substituição da concordata pela recuperação judicial não foi apenas mudança terminológica: foi a transição de um sistema punitivo — que via a empresa em dificuldade como passivo — para um modelo que abraça a reestruturação, preservando atividade, empregos e inovação.
Ao evoluir, a recuperação judicial tornou-se peça de equilíbrio do sistema produtivo, instrumento de diálogo entre empresários, credores e sociedade. A reforma da Lei nº 14.112/2020 alinhou o Brasil com as melhores práticas internacionais, ampliando a segurança jurídica e viabilizando negociações coletivas mais sólidas.
Hoje, diante de juros elevados, crédito restrito e incertezas globais, especialmente para o agronegócio, a recuperação judicial se reafirma em sua vocação histórica: não apenas suspender execuções, mas dar ao empresário o tempo necessário para reorganizar sua atividade e reencontrar o caminho do crescimento.
Embora ainda estejamos em setembro de 2025, algumas luzes no horizonte começam a se acender para 2026. Projeções como as do Ipea estimam crescimento do PIB em 1,8% no ano que vem, enquanto o Boletim Focus do Banco Central aponta inflação em torno de 4,31% e Selic em 12,5%. O governo, por sua vez, projeta PIB de 2,44%, inflação de 3,6% e Selic a cerca de 13,11%.
São sinais tímidos, mas concretos: a economia pode revelar sinais de estabilização, ainda que gradual — e a recuperação judicial se coloca, mais uma vez, como ferramenta de transição. Ela oferece suporte jurídico e administrativo para que a empresa enfrente o momento presente com fôlego, construindo estrutura até que condições mais favoráveis voltem a prevalecer.
Não se trata de romantizar a crise nem ignorar os desafios da retomada. A recuperação judicial exige estratégia, disciplina e compromisso. Mas foi sempre em momentos de adversidade que empresas — armadas com os instrumentos adequados — renasceram mais fortes e mais preparadas para o futuro.
Que essa realidade se confirme em 2026: um tempo não apenas de superação, mas de reconstrução. E que as decisões tomadas hoje, com técnica e coragem, sejam lembradas como a base sólida de negócios que sobreviveram e prosperaram.
*Marco Aurélio Mestre Medeiros é advogado, especialista em recuperação judicial de empresas do agronegócio, sócio-fundador do Mestre Medeiros Advogados Associados, com atuação nacional, e secretário-geral da Comissão Especial de Falências e Recuperação Judicial do Conselho Federal da OAB