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Cuiabá, 26 de Setembro de 2025
26 de Setembro de 2025

26 de Setembro de 2025, 17h:03 - A | A

OPINIÃO / LUIZ HENRIQUE LIMA

De Washington a Gaza

LUIZ HENRIQUE LIMA



O Museu Nacional do Holocausto, em Washington, é uma parada obrigatória para quem visita a capital dos Estados Unidos. Localiza-se no National Mall, ao lado do complexo de museus administrados pela Smithsonian Institution. É dedicado à memória das vítimas e sobreviventes do genocídio perpetrado pelos nazistas e divide-se em três partes: a ascensão do nazismo e das teorias de superioridade racial, os campos de concentração e extermínio e o pós-guerra. A exemplo de outros museus contemporâneos, como o Museu do Apartheid em Joanesburgo, conta com recursos de áudio, vídeo, iluminação e interação que tornam a experiência de conhecê-lo muito mais impactante do que a mera exposição de objetos ou documentos em paredes ou vitrines.

Não sou alguém que costuma chorar com facilidade, mas confesso que fiquei profundamente comovido ao entrar na Sala dos Sapatos, localizada no terceiro andar. Ali estão milhares de sapatos retirados de vítimas dos campos de concentração nazistas, especialmente do campo de Majdanek, na Polônia. São testemunhos silenciosos e ensurdecedores do horror e da violência inimaginável. Há sapatos de todos os tamanhos e tipos: masculinos, femininos, de bebês, botas, chinelos, novos, remendados, de couro, de lã, entre outros. Cada par encerra a história de um ser humano, interrompida tragicamente pela crueldade de um poder maligno, empenhado em destruir aqueles de uma etnia e religião diferentes das suas.

Ao percorrer o museu, o visitante se instrui, se incomoda, se indigna, se pergunta como aquilo foi possível, mas nada o prepara para o choque brutal que é o ingresso na Sala dos Sapatos. Sempre que ouço a palavra genocídio, essa imagem me vem à mente e recordo o mal-estar profundo que senti naquele ambiente.

Alguns anos depois, durante uma viagem à Alemanha, a programação incluía uma visita a Dachau, nas proximidades de Munique, o primeiro de todos os campos de concentração, onde foram perseguidos e assassinados socialistas, homossexuais, ciganos, testemunhas de Jeová, pessoas com deficiências e judeus, entre outros grupos vistos como inimigos pelos nazistas. Na última hora, desisti de ir, pois lembrei da minha reação na Sala dos Sapatos e quis poupar meus companheiros de viagem de algum constrangimento.

Hoje, ao acompanhar o que ocorre em Gaza, não tenho dúvidas: os palestinos são alvo de um genocídio. O território inteiro transformou-se num imenso campo de confinamento do qual não há como escapar e que está sujeito a bombardeios diários, que já ultrapassaram dezenas de milhares de toneladas de explosivos, incluindo munições pesadas, como as de 907 kg, que causam crateras de mais de 12 metros de diâmetro e têm alto potencial destrutivo em áreas densamente povoadas. Além da devastação da infraestrutura de escolas, hospitais, saneamento e casas de oração, incluindo as cristãs, o governo extremista de Israel bloqueia e impede a chegada de ajuda humanitária, como alimentos e medicamentos. A coragem quase-suicida de jornalistas e fotógrafos nos traz as imagens de crianças famintas e esquálidas e de mulheres desesperadas portando panelas e canecas vazias implorando por alguma comida.

Acredito que no futuro os meus filhos ou netos visitarão o Museu do Genocídio em Gaza e se emocionarão diante de uma Sala das Panelas. Vão se perguntar como isso foi possível e porque a nossa geração permitiu que isso acontecesse.

Luiz Henrique Lima é professor e conselheiro independente certificado.

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