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Cuiabá, 18 de Maio de 2024
18 de Maio de 2024

29 de Julho de 2018, 07h:50 - A | A

GERAL / CONDUTA MÉDICA

Violência obstétrica é a denúncia mais investigada pelo CRM-MT

A cada mês, seis médicos são alvos de inquéritos no Conselho, acusados de violência contra mulher na hora do parto.

MARCIO CAMILO
DA REDAÇÃO



Denúncias de violência obstétrica lideram o ranking de reclamações no Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso (CRM-MT). Dos 178 Procedimentos Ético Profissional (PEP's) em trâmite no ano passado (números mais atualizados), 76 médicos foram acusados de ter cometido algum tipo de agressão contra mulheres na hora do parto, o que representa uma média de 6 profissionais investigados todo mês.    

"A autonomia da mulher de escolher o parto é muito maior no sistema privado do que no público. No público, a cesária é por indicação da equipe medica, quando alguma coisa vai mal durante o parto”, enfatiza a presidente do CRM.

O caso mais recente que repercutiu na mídia aconteceu no Hospital Geral Universitário (HGU) de Cuiabá. A mãe Luana Lacerda Pinto, 21 anos, afirmou que foi obrigada a fazer o parto normal, quando, segundo ela, não havia dilatação suficiente para isso. O parto teve complicações e o bebê morreu. O CRM abriu uma sindicância para investigar a conduta da equipe médica. 

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A presidente do Conselho, Maria de Fátima Ferreira, destaca que a denúncia de Luana é uma das mais frequentes que chegam ao conhecimento do CRM, nas áreas de ginecologia e obstetrícia.  

“É uma gestante que não desejava ter um parto normal em um hospital público e é conduzida para isso. Nesses casos, a sindicância analisa todos os documentos e laudos médicos, como o pré-natal, que possam indicar uma recomendação prévia para o parto de cesária”, explica Fátima, que é medica pediatra.

Ela salienta que na rede pública a orientação do Ministério da Saúde é para dar prioridade ao parto normal, e deixar a cesária somente para casos de risco.

"A autonomia da mulher de escolher o parto é muito maior no sistema privado do que no público. No público, a cesária é por indicação da equipe medica, quando alguma coisa vai mal durante o parto”, enfatiza.

'Pique e deboches'

Há muitos relatos de mulheres sobre deboche da equipe médica. Reclamam de comentários indevidos no momento do parto como: "na hora de fazer sexo não estava sentindo dor”.

Outra reclamação constante é o procedimento de episiotomia, conhecido popularmente como “pique" (corte na região do períneo - entre a vagina e o ânus - para ampliar o canal de parto). Neste caso, a reclamação é que os médicos fazem o pique sem consultá-las, e que depois do procedimento isso traz dor física, disfunção sexual e incontinência urinária. 

Sobre o "deboche", Fátima destacou que tal conduta médica é inadmissível, mas ponderou que esse tipo de denúncia, pelo menos no CRM, não é recebida com muita frequência. 

Já sobre o pique, a presidente do CRM ressalta que se não houver indicação para o procedimento e mesmo assim ele for feito, o caso configura como violência. Mas ela pondera que existem "situações eletivas", decisões rápidas que o médico precisa tomar na hora do parto normal, "e que muitas das vezes não há tempo de consultar a mulher".

Se um médico é condenado num Processo Ético Profissional (PEP) do CRM, as penas podem resultar em advertência confidencial em aviso reservado; censura confidencial em aviso reservado; censura pública em publicação oficial; suspensão do exercício profissional até 30 dias; e nos casos mais extremos a cassação do exercício profissional.

‘Violência velada’

A doula Thattiany Carvalho Leite já ouviu muitas histórias de violência obstétrica na roda de conversa coordenada por ela, o "Sesc Materna", no espaço cultural do Sesc Arsenal.

ReporterMT/Elis Freitas

tati doula

Doula Thattiany Carvalho Leite com os seus dois filhos.

Ela observa que a maioria das violências é velada e que as pessoas associam violência obstétrica com um profissional grosseiro.

“Realmente alguns são, mas a maioria não é mais assim. Fala com muito cuidado que a mulher não precisa gritar, mas ele não está respeitando a fisiologia dela. São muito sutis as palavras que podem trazer para mulher, naquele momento, algum desconforto, como se ela não soubesse o que está fazendo”.

Nesse sentido, a doula destaca que é fundamental a futura mãe ter todas as informações necessárias sobre as condições do corpo dela na hora do parto.

“Se a mulher chega no parto sem saber como funciona o corpo dela, não terá o direto de escolha, já que não sabe as opções que existem. Por isso que é importante fazer o pré-natal para ela entender que o parto é dela, que pode sim ter a autonomia de escolher sobre o que estiver ocorrendo”, orienta Thattiany.  

A doula tem o papel de oferecer conforto, encorajamento, tranquilidade e suporte emocional para a mulher durante o período de gestão e na hora do parto. A palavra “doula” vem do grego e significa “mulher que serve”.

As rodas do Sesc Materna, coordenadas por Thattiany, ocorrem na segunda e na quarta quinta-feira de cada mês, das 18h às 20h, no Sesc Arsenal, que fica no bairro do Porto, em Cuiabá, próximo ao estádio de futebol Eurico Gaspar Dutra - o "Dutrinha".

Enfermeiros na mira

O Conselho Regional de Enfermagem de Mato Grosso (Coren-MT) informa que já deu início às investigações sobre a possível participação de profissionais de Enfermagem no atendimento à paciente Luana Lacerda, que denunciou a equipe médica do Hospital Geral Universitário (HGU) por negligência na realização do parto de seu filho, o que teria causado a morte da criança na última sexta-feira (20), depois de complicações e algumas semanas de internação.

Segundo o Departamento de Fiscalização do Coren-MT, os procedimentos de investigação serão baseados nas informações do prontuário médico e do Boletim de Ocorrência. Pela análise destes documentos, será possível observar qual a responsabilidade assumida por cada profissional e, a partir daí, tomar as medidas cabíveis, que podem incluir a instauração de processo ético. 

Há outros casos de violência obstetrícia em investigação no Coren Mato Grosso, os quais tramitam em sigilo.  Para além da fiscalização, o Conselho zela pela boa atuação do profissional na área obstétrica. Por exemplo, no passado aprovou a proibição da  participação de profissional de Enfermagem na realização de um procedimento voltado à aceleração do parto, a manobra de Kristeller, método que consiste na pressão sobre o ventre da parturiente, cujo uso é desaprovado pela Organização Mundial da Saúde, pelo Ministério da Saúde e pela Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia.

Estamos disponíveis para mais esclarecimentos.

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