Mato Grosso continua bastante desigual. Os pobres estão mais pobres e os ricos mais ricos. Essa disposição geoeconômica está sendo construída graças aos privilégios de alguns em detrimento dos demais.
De um lado, impulsionado pelas exportações de commodities, o agronegócio. Do outro, o Estado que não consegue arrecadar mais para investir na saúde, educação, segurança e infraestrutura. Isso nos mostra que a riqueza gerada pelo agronegócio não é distribuída como deveria ser para o Estado e a sociedade.
E por que isso acontece? Em grande parte, por causa dos benefícios da Lei Complementar nº 87 de 13/09/1996, que isentou do tributo ICMS os produtos e serviços destinados à exportação. A Lei Kandir completou este mês 22 anos e junto com ela, trouxe um rombo nas contas públicas do Estado.
Apesar da nossa economia crescer 10 vezes acima da média nacional – impulsionada pelo agronegócio que alavancou o PIB - a crise econômica se arrasta ao longo desses anos.
É justo somente os exportadores de commodities não pagarem impostos e o resto da sociedade sim? Claro que não é justo! Além disso, cabe um exame de consciência nos políticos e produtores do agronegócio sobre a necessidade de combater a desigualdade social. São milhares de crianças órfãs e abandonadas, jovens desempregados e desamparados, analfabetos, hospitais em situação precária, violência nas ruas e no campo e a pobreza cada vez maior.
Não é feio ganhar dinheiro honestamente pelo seu trabalho e até enriquecer. Mas, é desumano e egoísta não pensar na sociedade como um todo. Afinal, dependemos do convívio harmonioso com a sociedade para sobreviver.
O crescimento das exportações deve estar condicionado ao avanço da tecnologia, pesquisa e de uma melhor infraestrutura de transporte. A carga tributária tem que ser reduzida para todos os setores da sociedade, e não para alguns poderosos. Isso é usar a política para benefício próprio.
Da mesma forma, precisamos combater o gigantismo do Estado que impede investimentos e piora a qualidade dos serviços.
De toda a riqueza produzida pelo país, 37,7% (a carga tributária) são gastos pelo governo, que ainda se vê obrigado a refinanciar os pagamentos de juros de 6% do Produto Interno Bruto (PIB), elevando paulatinamente a dívida pública, que chega a 77,2% do PIB.
Esse pensamento setorial do agronegócio não é salutar para o Estado e a Sociedade. É preciso ter um equilíbrio, que o sociólogo Gilberto Freyre chamou de “democracia racial”. Em “Casa-Grande & Senzala”, Gilberto Freyre destaca a sociedade brasileira como fruto da miscigenação entre índios, negros e portugueses. Essa mistura é, para Freyre, caracterizada por um processo de equilíbrio de antagonismos, onde os conflitos de harmonizam.
O período eleitoral deveria ser um bom momento para essas discussões e para a formação de consensos na sociedade. É uma pena que isso não tenha ocorrido, quer pela falta do que já chamei de “educação política”, quer por uma cultura que privilegia a troca de favores e não os debates sobre projetos.
Mudar essa cultura é fundamental para que alcancemos, por meio da democracia, meios para superar as desigualdades e promovermos um desenvolvimento verdadeiramente sustentável.
VICENTE VUOLO é economista e cientista político.