DO REPÓRTERMT
A Polícia Federal identificou um sistema bancário paralelo em dólares, operado pelo doleiro Surrey Ibrahim Mohamad Youssef, para dar suporte financeiro ao advogado de Cuiabá Roberto Zampieri, apontado como uma das principais figuras no esquema de venda de sentenças que teria alcançado gabinetes de ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e tribunais estaduais, como os de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
Conforme o Estadão, Surrey era responsável por fazer pagamentos em espécie e remessas em dólar que abasteciam o circuito de propinas intermediado por Zampieri, morto a tiros em dezembro de 2023, em Cuiabá. A PF descreve o doleiro como o operador de um “sistema clandestino de compensações financeiras” usado para movimentar valores pagos pela compra de decisões judiciais.
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“Surrey era responsável por operacionalizar o sistema bancário paralelo que viabilizava a circulação clandestina dos valores ilícitos”, afirma o relatório assinado pelo delegado Marco Bontempo, que conduz o inquérito sob supervisão do ministro Cristiano Zanin Martins, no Supremo Tribunal Federal (STF).
As mensagens obtidas pela PF revelam que propinas eram pagas em dólares, entregues pessoalmente a Zampieri ou a seus intermediários em São Paulo. Em uma troca de mensagens de março de 2023, o advogado orienta um emissário a buscar uma “encomenda” no escritório de Surrey. “Sabe o valor que me deixaram lá?”, pergunta o doleiro, antes de confirmar a entrega mediante senha e código secreto.
Durante o cumprimento de mandado de busca, os federais encontraram na casa de câmbio de Surrey, na Rua Oscar Freire, uma mochila com grande quantidade de dinheiro vivo, reforçando a suspeita de que o sistema de câmbio paralelo estava ativo.
A PF apura se os dólares repassados a Zampieri, conhecido como o “sócio dos tribunais”, eram parte de propinas a magistrados e assessores de cortes superiores. As investigações se concentram em processos de falência e causas milionárias do agronegócio, que teriam sido “negociadas” mediante pagamento.
Diálogos revelam movimentação fracionada
Conversas interceptadas mostram que Zampieri recebia valores em etapas, estratégia usada para escapar dos mecanismos de controle financeiro.
Em abril de 2022, o advogado tratou com o doleiro sobre o recebimento de R$ 500 mil, parte de um “saldo de cliente”. Surrey propôs transferências fracionadas em contas diversas. “Esse teste vai ser hoje”, escreveu o doleiro.
Nos dias seguintes, enviou quantias de R$ 15 mil, R$ 16 mil e R$ 9 mil, até completar o valor prometido. “Amanhã eu zero, tá? O cara falou comigo, sem falta a gente zera bonitinho”, disse Surrey em uma das mensagens.
A PF descreve a técnica como uma “pulverização de valores reduzidos e periódicos”, forma de mascarar a origem ilícita e dificultar o rastreamento.
Propinas e luxo
Segundo os investigadores, Zampieri mantinha relação direta com magistrados, a quem presenteava com dinheiro, relógios e até barras de ouro. O advogado seria o elo entre empresários, lobistas e juízes.
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O doleiro, por sua vez, administrava a parte financeira do esquema. Dono de uma casa de câmbio há quase 30 anos, ele teria usado sua estrutura para lavar recursos e converter propinas em dólares.
Prisão de lobista liga pontas da investigação
Na manhã desta quarta-feira (12), a PF prendeu novamente o lobista Andreson Gonçalves de Oliveira, em Primavera do Leste (238 km de Cuiabá), também investigado na Operação Sisamnes.
Andreson já havia sido preso por envolvimento no mesmo esquema e estava em prisão domiciliar por problemas de saúde. Seu nome surgiu após a devassa no celular de Zampieri, que revelou uma rede de contatos entre advogados, doleiros e operadores ligados ao submundo da venda de decisões judiciais.
Outro lado
A defesa de Surrey Youssef, representada pelo advogado Anivaldo dos Anjos Filho, afirmou ao Estadão que ele é “empresário do ramo de turismo e câmbio, com empresa regularmente constituída e fiscalizada”, e nega qualquer envolvimento em crimes.
“Surrey nega veementemente envolvimento em práticas ilícitas e reitera sua disposição em colaborar com as autoridades”, diz a nota.














