CELLY SILVA
DA REDAÇÂO
O empresário e vítima na ação penal referente à operação Sodoma, João Batista Rosa, prestou depoimento na noite desta quarta-feira (17), na Sétima Vara Criminal de Cuiabá. Ele iniciou suas declarações explicando que desde o ano de 2003 tinha créditos de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) para receber da Secretaria de Estado de Fazenda, mas, a partir de 2005 não conseguia reaver esse crédito de cerca de R$ 2 milhões. Em 2010, a situação se complicou ainda mais por conta de uma portaria que retirava esse direito de forma retroativa até 2007.
“No ano de 2010, eu tive a oportunidade de ficar alguns minutos a sós com o governador”, disse o empresário em relação à Silval Barbosa (PMDB) que, na época, já era o chefe de Estado e estava concorrendo à reeleição. João Batista Rosa afirma, inclusive, que contribuiu com R$ 50 mil para a campanha eleitoral do peemedebista a pedido do ex-secretário Pedro Nadaf.
“O governo está te ajudando, não está? Então, você tem que ajudar o governo”, teria dito Nadaf a João Batista Rosa.
De acordo com Rosa, nesse encontro a sós com Silval, ele intercedeu pela compensação dos créditos de ICMS a que ele tinha direito e o ex-governador teria lhe dito que, se eleito, iria resolver essa questão.
Após a reeleição, o empresário procurou Pedro Nadaf e os dois foram juntos conversar com Silval Barbosa sobre a demanda fiscal do empresário. Silval os orientou a procurar o então secretário-adjunto de Fazenda, Marcel de Cursi. Este, por sua vez, disse que na Sefaz, não tinha condições de resolver, mas que o próprio Nadaf poderia resolver o problema enquadrando as empresas de João Batista Rosa no Prodeic (Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso) para que ele não ficasse no prejuízo, pois receberia seus créditos em forma de benefícios fiscais.
Dessa forma, as três empresas de João Batista Rosa foram enquadradas no programa de incentivos fiscais. De acordo com o depoimento de Pedro Nadaf, na última segunda-feira (15), as empresas de Rosa preenchiam os requisitos para participar, mas o enquadramento se deu de forma irregular. Nesta quarta-feira (17), o empresário afirmou que acreditava que o processo havia sido feito dentro dos trâmites normais, na época. “Eu não tinha nem noção da organização criminosa que era”, disse.
De acordo com o depoimento de Rosa, naquele mesmo ano de 2011, alguns meses depois da negociação entre os ex-gestores e o empresário, Nadaf procurou João Batista e pediu uma ajuda de R$ 2 milhões para pagar dívidas de campanha de Silval. Ele se negou alegando que não tinha condições e ouviu do ex-secretário: “O governo está te ajudando, não está? Então, você tem que ajudar o governo”.
Segundo o empresário, ele não concordava com a ideia de que estava sendo ajudado pelo governo pois ele tinha o direito aos créditos do ICMS, mas entendeu também que “se eu não pagasse eu perderia o benefício”, disse.
“Eu fui vitima de uma quadrilha, uma organização criminosa que complicou a minha situação, colocou minha empresa em risco, uma empresa que emprega mais de 300 funcionários”, lamentou o empresário
O pagamento então se deu com uma entrada de R$ 500 mil e o restante foi sendo pago a Nadaf em parcelas mensais de R$ 30 mil. Em 2012, segundo o depoimento de Rosa, Nadaf o procurou para dizer que o prazo do benefício do Prodeic havia sido aumentado para 10 anos. “Foi quando ele me pediu mais dinheiro e eu passei seis cheques de R$ 83 mil”. Conforme a denúncia do Ministério Público Estadual (MPE), esses cheques foram entregues por Nadaf ao ex-procurador do Estado, Francisco Gomes de Andrade Lima Filho, o Chico Lima, que por sua vez, “lavou” o dinheiro na factoring FMC, de Filinto e Frederico Muller. Apesar disso, João Batista Rosa afirma nunca ter tido contato com os demais réus, além de Silva, Nadaf e Cursi.
Já em 2013, Nadaf sugeriu um contrato com emissões de notas fiscais entre sua empresa NBC Consultoria e o empresário para dar uma “roupagem” de legalidade à propina. Uma das últimas cobranças de Nadaf a Rosa teria sido um cheque de R$ 15 mil que seria destinado à Marcel de Cursi, isso em julho de 2013.
Nessa época, já descontente com a situação, João Batista Rosa afirma que mandou instalar câmeras e microfones em seu escritório para “flagrar” o esquema de Nadaf e Cursi. Mas, “estranhamente, na hora que ele (Marcel) foi lá, os equipamentos desligaram. [..] Ele deu um sorriso sarcástico e disse que o Nadaf só tinha passado R$ 5 mil para ele”, relatou o empresário, que disse ainda ter sido “covardemente extorquido”.
Rosa ainda disse à juíza Selma Rosane Arruda que, ao proceder com o enquadramento no Prodeic, em 2011, Marcel de Cursi lhe entregou um termo de renúncia dos créditos de ICMS, o que, mais recentemente, desencadeou, junto com outros casos, a instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Renúncia e Sonegação Fiscal, na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT).
Quando isso ocorreu, o empresário relata que Nadaf e Cursi combinaram que eles contatariam os deputados envolvidos. Pedro Nadaf ficaria responsável de falar com Wilson Santos (PSDB) e pediu que João Batista Rosa procurasse Emanuel Pinheiro (PMDB), mas o empresário não seguiu a instrução porque, a esse ponto, já havia percebido o nível de irregularidades em que suas empresas estavam inseridas.
“Eu fui vitima de uma quadrilha, uma organização criminosa que complicou a minha situação, colocou minha empresa em risco, uma empresa que emprega mais de 300 funcionários”, lamentou o empresário em seu depoimento.