ABDALLA ZAROUR
DA REDAÇÃO
Antes de tomar posse na 18ª Legislatura da Assembleia Legislativa, o deputado Emanuel Pinheiro (PR) estava confiante de que algo poderia mudar a eleição da Mesa Diretora da Casa.
Chegou a dizer que haveria surpresas, ou seja, que pudesse, pelo menos, atrapalhar a candidatura de Guilherme Maluf (PSDB). O objetivo de Emanuel Pinheiro era ser um candidato à presidência de forma avulsa, já que não teria uma chapa totalmente fechada.
Anunciou a entrega de um documento que pudesse ser analisado pelo Jurídico da Assembleia antes do início da eleição. Mas não aconteceu. Ele disse que não queria com isso também retardar a condução eleição da Mesa. “O estado de Mato Grosso passa por um vexame nacional por não ter em seu regimento a previsão de candidatura avulsa”, pontuou.
Em discurso no Plenário logo após a posse, Pinheiro anunciou desistência da candidatura e fez um discurso semelhante ao que o governador Pedro Taques (PDT) fez quando disputou a presidência do Senado Federal, em 2012, contra o senador Renan Calheiros (PMDB), quando este foi senador. Na oportunidade, Taques fez um discurso de perdedor, já que tinha a certeza que não venceria Calheiros naquela eleição. Pinheiro fez o mesmo. Fez um discurso sabendo o final que lhe esperava.
Emanuel Pinheiro chegou a dizer que houve interferência do Executivo na condução da eleição da Mesa. O parlamentar disse que vinha com a proposta de mudança com ele na presidência e o empresário Eduardo Botelho (PSB) como primeiro-secretário.
O PR, apesar de estar na Mesa Diretora com os deputados Nininho e Wagner Ramos, passou por turbulências quando o deputado Mauro Savi (PR) disse que era candidato à presidência. Savi ganhou apoio do senador Wellington Fagundes (PR) e isso foi motivo para provocar revolta entre os deputados, entre eles, Emanuel Pinheiro.
ABAIXO, O DISCURSO USADO POR TAQUES NA ELEIÇÃO DA PRESIDÊNCIA DO SENADO EM 2012.
Sr. Presidente, senhoras senadoras, senhores senadores. Cidadãos que nos acompanham pela TV e Rádio Senado. Amigos das redes sociais,
É como um perdedor que ocupo hoje esta tribuna. Venho como alguém a quem a derrota corteja: certeira, transparente, inevitável, aritmética. Sou o titular da perda anunciada, do que não acontecerá.
Mas o bom povo de Mato Grosso não me deu voz nesta Casa para só disputar os certames que posso ganhar, mas para lutar, com todas as minhas forças, as batalhas que forem justas. Sigo o exemplo do apóstolo Paulo, também um perdedor, degolado em Roma por levar a mensagem do Cristo: quero poder dizer a todas as pessoas que combati o bom combate.
As palavras dos vitoriosos são lembradas. Seus feitos, realçados. Sua versão, tende a se perenizar. O sorriso do orgulho lhes estampa a face, tantas vezes, antes mesmo de vencerem. E nem sempre se pergunta que vitória foi esta que obtiveram. Será a vitória do Rei Pirro, que bateu os romanos na Batalha de Heracleia (280 A.C.) e olhando desconsolado para suas tropas destroçadas, disse que "outra vitória como aquela o arruinaria"? Será a vitória do Marechal Pétain, que ocupou o poder numa França emasculada pelos nazistas, traindo o melhor de sua gente? Será a vitória sem honra dos alemães diante do levante de Varsóvia?
Pois existem vitorias que elevam o gênero humano e outras que o rebaixam. Vitórias da esperança e vitórias do desalento. E, tantas vezes, é entre os derrotados, os que perderam, os que não conseguiram, que o espírito humano mais se mostra elevado, que a política renasce, que a sociedade progride.
Minha voz não é a da vitoriosa derrama de El-Rey de Portugal, mas a dos derrotados inconfidentes que fizeram germinar o sonho da nossa independência. O grande herói brasileiro, senador Aécio, – Tiradentes - é um perdedor, pois a Conjuração Mineira não venceu, naquele momento, mas nem as partes de seu corpo pregadas na via pública, ao longo do caminho de Vila Rica, o impediram de ser um brasileiro imortal.
Valho-me da memória de outro grande brasileiro, Ulisses Guimarães, anticandidato, lançado em 1973 pelo então MDB, MDB Jarbas Vasconcelos, MDB Pedro Simon, MDB Requião, tendo como vice-anticadidato Barbosa Lima Sobrinho. "Vou percorrer o país como anticandidato", disse Ulysses, para denunciar a "anti-eleição", do regime militar.
Ulysses Guimarães, este grande perdedor, este grande brasileiro.
Pois aqui estou, emulando o espírito daqueles grandes homens:
Eu me anticandidato à Presidência deste Senado da República.
Apresento-me para combater o bom combate. Quero ser Presidente da Casa da Federação. Quero que a sociedade brasileira observe que as coisas podem ser diferentes, que o passado não precisa necessariamente voltar, que há modos novos e melhores de fazer política, que esta Casa não é um apêndice, um "puxadinho" do Poder Executivo, mas que estamos aqui também pelo voto direto que nos deram o bom povo de nossos Estados.
Chega do Senado-perdigueiro! Chega do Senado-sabujo! Somos senadores, não leva-e-trazes do Poder Executivo!
Não podemos respeitar os demais poderes, o Executivo ou o Judiciário, se não nos respeitamos a nós próprios. Não ajudamos a boa governança constitucional, se nos olvidamos de nossos deveres, de nosso papel e nossas prerrogativas. Nossa omissão alimenta o agigantamento dos outros poderes, o que a Constituição repele.
É como derrotado que posso dizer francamente que a sociedade brasileira clama por mudança, por dignidade, por esperança, por novos costumes políticos, por uma nova compreensão de nosso papel como senadores.
Anticandidato-me à Presidência do Senado, para combater o mau vezo do Poder Executivo de despejar suas medidas provisórias, ainda que fora de situações de urgência e relevância, em continuado desprestígio de nossas prerrogativas legislativas.
Lanço-me para que façamos valer a Constituição e seu artigo 48, II, segundo o qual devemos velar pelas prerrogativas de nossa Casa Legislativa. Almejo aplicar severa e serenamente, o artigo 48, XI, do Regimento Interno do Senado, segundo o qual o Presidente tem o dever de impugnar proposições que lhe pareçam contrárias à Constituição, às leis e ao próprio Regimento".
Eu, anunciado perdedor, comprometo-me perante meus pares e perante todo o país a impugnar estes exageros do Poder Executivo. Será que o anunciado vencedor pode fazer idêntica promessa?
Vou aplicar o mesmo rigor aos "contrabandos legislativos", impedindo que o oportunismo de alguns acrescente às já abusivas Medidas Provisórias as emendas de interesses duvidosos que nada têm a ver com o objeto original da medida que se supõe urgente e relevante.
Prometo desconcentrar o meu poder como Presidente, distribuindo a relatoria dos projetos por sorteio. Como agirá o vencedor? Distribuirá apenas entre os seus?
Vou criar uma agenda pública e transparente, a ser informada a toda a sociedade brasileira, para a apreciação dos vetos presidenciais, estas centenas de esqueletos que deixamos por aqui. Vou designar as comissões e convocar as sessões do Congresso Nacional que se façam necessárias. Como farão os vencedores?
Vou além: toda a agenda legislativa tem de ser democratizada. Comprometo-me a construir mecanismo pelo qual os cidadãos possam formular diretamente requerimentos de urgência para votação de matérias, nas mesmas condições que a Constituição exige para a iniciativa popular de projetos de lei.
Farei ainda com que o Senado invista no desenvolvimento de mecanismos seguros de petição digital, para facilitar a mobilização dos cidadãos em torno das iniciativas populares já previstas na nossa Carta Magna.
Mobilizarei também toda a Casa para promover a atualização dos textos dos Regimentos Internos do Senado e do Congresso Nacional, documentos originários de resoluções dos anos 70, aprovadas durante o período escuro de nosso país e anteriores até mesmo à nossa Constituição democrática.
Aos servidores do Senado faço o compromisso de dar o que eles, profissionais dedicados, mais querem: organização, estruturação administrativa eficiente, seriedade, probidade. É também o que espera a sociedade brasileira. Não serão tolerados abusos de qualquer ordem. Funcionários públicos, representantes do povo, estamos aqui para servir a Sociedade e o Estado e não para nos servimos deles!
Como farão os vencedores? O que farão aqueles que já venceram antes e nada fizeram? Como esteve o Senado, quando ocupado pelos presumidos vencedores de hoje?
Posso ser um perdedor, mas para mim, a lisura, a transparência, o comportamento austero são predicados inegociáveis de um Presidente do Senado. Será que os vencedores também poderão dizê-lo?
Os que hão de vencer dialogarão com a classe média, com os trabalhadores, as organizações da sociedade civil, com a Câmara dos Deputados, com estudantes e donas-de-casa? Os vencedores darão continuidade a reformas como a do Código Penal, a Administrativa e o Pacto Federativo, ou preferirão deixar as coisas como estão?
A ética estará com os vencedores ou com os perdedores, Senhores Senadores?
Quais de nós serão mais bem acolhidos, não nesta Casa, mas pela sociedade brasileira. Os vencedores ou os perdedores?
Queremos o melhor para nós ou o melhor para a nação?
Existem voltas ainda hoje esperadas, como a de Dom Sebastião, que se perdeu nas batalhas africanas. A volta do Messias, esperado por judeus e cristãos. Os desaparecidos na época do regime militar, senador Aluísio, que hão de aparecer, ainda que para a dignidade de serem enterrados pela família.
Mas existem voltas que criam receios, de continuísmo, de letargia, de erros ressurgentes.
Sou o anticandidato, o que perderá. Não sou especial. Não tenho qualidades que cada cidadão brasileiro, trabalhador e honesto, não tenha também. A ética que proclamo é aquela que quase todos os brasileiros se orgulham de cultivar. Eu não temo o próprio passado e, portanto, não tenho medo do futuro. Falo pelos derrotados deste país, todos os que ainda não conseguiram seus direitos básicos: as mulheres, senadora Lídice da Mata; os índios, senador Wellington Dias; as crianças, senadora Ana Rita; os negros, senador Paulo Paim; os assalariados, senador Jaime Campos; os sem casa, senador Rodrigo Rolemberg; os sem escola, amigo Cristovam Buarque.
Falo pelos sem voto, aqueles que, embora titulares da soberania popular – o cidadão – se vêem alijados da disputa pela Presidência desta Casa, porque o terreno da disputa se circunscreveu aos partidos da maioria.
Essa não é mais a candidatura do Pedro Taques, e sim do PDT, do PSOL, do PSB, do DEM, do PSDB e de corajosos senadores de outras legendas, que não se submetem. Por que, como diz o poeta cuiabano Manoel de Barros, "quem anda no trilho é trem de ferro, liberdade caça jeito".
Essa candidatura é daqueles que nunca tiveram voz nesta Casa, é dos mais de 300 mil brasileiros que assinaram a petição online "Ficha Limpa no Senado: Renan não", promovida pelo portal internacional Avaaz.
Sei que nossa derrota é certeira, transparente, inevitável, aritmética. Mas faço minha a fala do inesquecível Senador Darcy Ribeiro:
"Fracassei em tudo o que tentei na vida.
Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.
Tentei salvar os índios, não consegui.
Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.
Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei,
Mas os fracassos são minhas vitórias.
Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu".