ONOFRE RIBEIRO
Está bem claro que o universo político não avaliou e nem está avaliando seriamente as manifestações das ruas. Um pouco de autoritarismo, pouca fé no povo, e muita certeza da impunidade vigente no país. Trago o assunto a partir de uma longa reportagem publicada no último domingo no caderno especial Eu e Fim de Semana, do jornal Valor Econômico. É uma entrevista com o filósofo e cientista político Marcos Nobre, professor da Unicamp, o primeiro a transformar em livro a percepção das manifestações de rua desde junho último. O livro é “Choque de democracia: razões da revolta”.
É um texto claro e profundamente incômodo. Confesso que precisei deixar a leitura, sair e fazer outras coisas, voltar, sair de novo e a cada sentada, ficava mais incomodado. Postarei o texto na íntegra da reportagem no www.facebook.com/onofreribeiro já que o jornal é de pouco acesso em Mato Grosso. O que diz Marcos Nobre de tão incômodo? Vou pinçar algumas frases inicialmente:
- “A sociedade é muito mais avançada do que o sistema político. Ele se mantém porque consegue convencer a sociedade de que é a expressão dela”.
- “(...) o que ocorreu em junho foi uma explosão do sentimento de que se tornou insuportável o descompasso entre o funcionamento do sistema político e as aspirações da sociedade”.
- “Há um argumento partilhado pela direita e pela esquerda, de que a sociedade brasileira é conservadora. Isso legitimou o conservadorismo do sistema político: existiriam limites para transformar o país, porque a sociedade é conservadora, não aceita mudanças bruscas. Isso justifica o caráter paquidérmico da redemocratização e da redistribuição da renda. Mas não é assim. A sociedade é muito mais avançada do que o sistema político”.
- “Ficou claro nas revoltas de junho: há um descompasso entre a cultura política democrática da sociedade e o sistema político. A sociedade é bem mais polarizada do que o sistema.” (...) As pessoas ficaram chocadas pela agressividade dos protestos de junho, pela quantidade de opiniões divergentes. Mas democracia é isso. O medo da polarização é um mito conservador. É na discussão que se criam as regras da convivência. Não tem outro jeito, senão a velha repressão.”
A conclusão critica a maneira convencional de se fazer política e diz: “A nova geração como num todo já incorporou o avanço democrático. São pessoas que se formaram na democracia”. Por isso não é difícil de concluir que as ruas estão apenas começando a se manifestar, cada vez mais ativas em busca da nova ordem política!
Onofre Ribeiro é jornalista em Mato Grosso.