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Cuiabá, 07 de Maio de 2024
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18 de Agosto de 2013, 17h:46 - A | A

POLÍTICA / ADITIVOS NAS OBRAS

Governo tenta empurrar responsabilidade sobre projeto executivo às empreiteiras

"O que eles usam para fazer licitação é na verdade um projeto de viabilidade econômica, capenga, que só define uma proposta", disse o presidente do Crea Juarez Samaniego

ANA ADÉLIA JÁCOMO



O Congresso Nacional deve apreciar nos próximos dias um projeto de lei que transfere às construtoras e empreiteiras a responsabilidade sob a confecção do projeto executivo de obras públicas. A proposta se baseia em outras duas leis, a do Regime Diferenciado de Contratação (RDC) e a Lei das Licitações. A ideia é agilizar as obras e reduzir os aditivos, que podem elevar o valor das construções até 25%, ou 50% no caso de reformas.

O tema é polêmico e, segundo o presidente do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura de Mato Grosso (Crea-MT) Juarez Samaniego, a falta de um bom projeto executivo dá margem a reajustes e alterações constantes no orçamento e nas obras, gerando atrasos e gastos adicionais. Ele disse que a proposta é inviável na prática e apontou para a necessidade de o Governo tomar para si a responsabilidade de especificar o que quer construir.

“O que eles usam para fazer licitação é na verdade um projeto de viabilidade econômica, capenga, que só define uma proposta. A empresa chega lá e o engenheiro percebe que precisa de alteração. Falam que o RDC é bom, mas só as grandes empresas lucram, porque para as pequenas, vai ser uma quebradeira. Nenhum empreiteiro em sã consciência vai aceitar uma obra sem projeto fechado”, disse o profissional.

No fim de julho, o Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) decidiu abrir a discussão e encaminhou à Presidência da República um manifesto em que propõe a alteração da legislação para que as obras públicas sejam licitadas somente a partir do projeto completo. A responsabilidade da criação da proposta passa a ser exclusivamente dos vencedores da licitação.

Juarez aponta uma falha na estrutura do Governo e diz que o grande problema é a falta de profissionais adequados para a criação de projetos executivos. “O correto é não ter aditivos. Mas sou contrário a essa lei. Não é essa a saída para ter redução e custos. A confecção do projeto é tudo. Um bom projeto pode custar de 1 a 5% do valor total da obra. O Governo é o cliente e ele não tem como se eximir da responsabilidade de dizer o quer”, disse o presidente do Crea.

O analista político Alfredo da Mota Menezes tem um posicionamento bem mais contundente sobre o tema. Ele acredita que a medida deve, sim, reduzir os gastos e os custos das grandes obras públicas, posto que o RDC seria um exemplo disso. “Não só reduz os aditivos, mas a ladroagem. Os empreiteiros falam que não tem responsabilidade nenhuma sob o valor da obra. O corpo técnico dos Governos é ruim, se um engenheiro é bom, ele não vai querer receber um salário de R$ 5 mil no Governo. Ele faz o projeto executivo com erros. O RDC foi um embrião de mudança”, sustentou o profissional.

INVESTIMENTO EM PESSOAL

Entre as alternativas para minimizar o impacto dos erros nos projetos executivos, está à criação de uma carreira de estado para os fiscais de obra. Para Alfredo, a colocação deve atribuir um bom salário para os engenheiros e arquitetos que farão os projetos. Caso contrário, o ideal é que a empreiteira faça a própria proposta.

“Do jeito que está não dá. O empreiteiro joga o preço lá embaixo, faz uma obra porcaria e depois pede aditivo. O Congresso tem que aprovar alguma coisa boa, porque as obras públicas, a exemplo das rodovias, estão sendo muito mal feitas”, disse Alfredo.

O presidente do Crea alertou para a possibilidade de o empresariado fazer o projeto de execução da obra com o preço mais caro, visando aumentar seu lucro. No Brasil, há atualmente R$ 30 bilhões de obras públicas paralisadas com recursos federais.

“O Governo é tem que fazer ou contratar o projeto. Hoje, quem assina a planilha orçamentária do Governo é alguém de um cargo administrativo. Não tem responsabilidade técnica de um engenheiro assinando uma planilha. Tem que ter seriedade. Se houver um projeto bem feito, te garanto que não há aditivos”, disse Juarez.

ERROS FATAIS

Em Cuiabá, a construção da Arena Multiuso Pantanal já recebeu quatro aditivos desde seu início. Os três primeiros foram em 2010 e o último em 2012. Em 2010, a obra do novo estádio exigiu alterações de aproximadamente R$ 17 milhões por causa da descoberta de minas de água no terreno, que demandaram reforços nos sistemas de drenagem e fundação. O erro no projeto custou caro ao erário público.

Mais uma vez, em agosto de 2012, um aditivo no valor de R$ 60,6 milhões foi realizado. A medida foi adotada em função da necessidade de revisão e atualização em alguns itens do projeto do estádio, como instalações gerais e até mesmo acabamento. O valor contratado pelo Governo com a Mendes Júnior inicialmente foi de cerca de R$ 342 milhões. Considerando os aditivos, o valor atual do contrato com é de R$ 420 milhões.

PROJETO MINUNCIOSO É SOLUÇÃO

Um projeto executivo, além de englobar estudos de solo, hídricos, insolação e diversos outros projetos técnicos feitos por diferentes profissionais — que incluem cálculo estrutural, iluminação, acústica, ar condicionado e exaustão, instalações hidráulicas e elétricas, paisagismo —, um projeto completo ainda deve ter a definição de acabamentos, o que inclui o tipo de materiais a serem utilizados à espessura de vidros e madeiras usadas em esquadrias, por exemplo.

Já o projeto básico apresenta apenas a planta dos pavimentos, a fachada e a planta de situação, que mostra a inserção do prédio no terreno. “Com essas informações, é impossível se fazer um orçamento. O que está acontecendo hoje é que os custos estão sendo calculados com base em suposições”, disse o presidente do Crea.

A reportagem chegou a marcar uma entrevista com o secretário-adjunto de Obras Públicas, Jean Martins, mas até a edição deste material ele não foi encontrado para falar sobre o assunto.

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