CHRISTIANE BATISTA
Câmara e Senado aprovaram nesta semana a MP das Elétricas, que regulamenta a prorrogação antecipada e condicionada das concessões do setor elétrico. A manobra toda ocorreu em um dia e no senado foi por votação simbólica - situação onde a pauta é menos complexa ou os votos já são um tanto quanto combinados: quem concorda permaneça como está, quem discorda se manifeste. Não há registro do voto de cada parlamentar ou identificação de seu posicionamento diante do tema. É ligeiro apregoamento, o grito do feirante vendendo maxixe.
Mas isso não foi nada diante da engenhosidade providencial do PT e PMDB em apertar o passo. Deitaram o cabelo nas discussões com a oposição e conseguiram o intento de não fazer o texto voltar para a câmara, aprovando-o como estava, sem ressalvas, sem discordância, sem adequações. A ordem do dia da maioria governista era empurrar tudo do jeito que estava para a sanção. E não foi por falta de discussão, já que a oposição criticou, tanto na câmara quanto no senado, a rejeição da alteração do texto derrubando a alíquota do PIS e da COFINS da conta de luz - rejeição que viria a ser uma quebra de promessa eleitoral da presidenta e que majoraria o desconto da conta em até 25%, segundo eles.
"Não basta fazer cortesia com o chapéu alheio. Que o governo federal faça sua contribuição com a redução das alíquotas!", protestou o líder tucano Alvaro Dias (PSDB-PR).
Esta cortesia é referência à intenção de redução do ICMS ao invés do PIS/COFINS já de fora da MP. A diminuição do preço final da conta de luz está fiada também nisso. Na MP ainda foi encerrado o prazo para concessionárias e distribuidoras aderirem às medidas, também em represália à não aderência das geradoras atuantes nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná, onde o governo é PSDB.
Estes estados alegam seu ICMS já reduzido em relação aos outros, o que é verdade. E por esta recusa na adesão o desconto prometido pelo governo caiu e a presidenta então fez mais uma promessa: o governo federal irá subsidiar os custos para alcançar o desconto prometido. Neste ponto tenho a impressão de estar assistindo a uma queda de braço. Um joguinho de passa-ou-repassa. Mas não se poderia esperar nada diferente de uma legião política cujo líder ideológico declara que defende o controle externo do judiciário, que na sua visão (estrábica) é uma caixa-preta.
Natural a birra do ex-presidente com o judiciário, posto que sempre soube ser o único inimigo das falcatruas permanentes de seu governo, inimigo a ser exterminado. O legislativo, bem se vê na aprovação da MP desta semana, é apropriadamente corrompível, uma boa grana resolve. O judiciário, bem se vê na questão da Ação Penal 470, é diferente. Isso explica o fato do legislativo receber periodicamente encomendas do executivo para atacar o judiciário, por exemplo, a PEC 3/2011 que autoriza o legislativo a sustar atos do judiciário.
No caso da energia, a pressa para apreciar a MP na Câmara e no Senado se deveu ao recesso parlamentar com início na próxima semana, jogando para o próximo ano todas as questões que ficarem pendentes. Então, para que tudo comece a valer logo, não poderia a MP voltar à câmara para reavaliação de alterações fora do interesse da maioria governista e de interesse somente da oposição.
Concomitante às palhaçadas deste circo, todas as usinas térmicas do país estão em pleno funcionamento desde outubro, quando os reservatórios das hidrelétricas do Sudeste e Centro-Oeste atingiram os piores níveis desde a era do apagão, lembra-se dele? Estas termelétricas são as mais caras maneiras de gerar energia por serem movidas a combustíveis fósseis ou carvão. Tudo isso queimando e gerando a fumaça e poluição próprios e ao preço pouco praticável do óleo combustível ou gás natural. Passando a régua, o custo da brincadeira eletrizante está estimado em 3,2 bi para todo o período em que estiverem ligadas e adivinha: será todo transferido às contas de luz no ano que vem.
Segundo o presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales, “o acionamento das usinas não teria ocorrido se houvesse um planejamento coerente do sistema entre o Operador Nacional do Sistema Elétrico e a EPE – estatal vinculada ao Ministério de Minas e Energia que planeja o longo prazo do setor, num horizonte de dez a trinta anos, ambos atuando com os mesmos critérios”. Sales explica que há um descompasso entre o que é determinado pela EPE e o ONS. Ou seja, é pendência federal crítica, um vácuo, um buraco-negro. Nota-se outra vez que planejar não é o forte da dinastia PT.
Não sei quanto a você, mas eu entendo bem porque não planejaram o já frágil setor elétrico brasileiro. Estavam ocupados demais nos últimos dez anos batendo a carteira do país, o Capo e sua trupe e, ainda não exaurido, vocifera em seus discursos atuais, literalmente: “Nós temos que ganhar ainda muitos governos de estado, muitas prefeituras, temos que ganhar muita coisa.” De mãos dadas está o Congresso Nacional, aprovando aos 46 minutos do segundo tempo medidas populistas e iniciando a campanha eleitoral pró-Lula 2014.
Na ponta do lápis a maquiagem “desconto na conta da luz” é inócua, posto que nossas luzes de Natal estão acesas graças às caras usinas termelétricas e não há qualquer luz no fim do túnel indicando interesse no setor. Bom é saber que para ter um Natal iluminado precisamos apenas de muitos abraços da família e amor no coração – estes são suficientes para clarear as nossas vidas. Bom Natal a todos.
Christiane Batista é advogada e acadêmica de Letras da UFMT